Condomínio e associação de moradores, o custeio de encargos e o Poder Judiciário
A evolução da vida em sociedade, com os problemas que surgiram, principalmente, nos países em desenvolvimento, tais quais o Brasil, como a segurança pública, e a tentativa de resolução de outros assuntos da vida em cotidiano, como a otimização de espaços e distâncias entre casa e trabalho, além do crescimento do mercado imobiliário, fizeram com que cada vez mais pessoas optassem e procurassem por moradias e negócios em edifícios residenciais e comerciais, respectivamente, e, ainda, da mesma forma, em loteamentos residenciais ou empresariais.
A forma jurídica de cada empreendimento pode trazer conseqüências diversas principalmente quanto à forma de custeio das taxas condominiais e dos encargos associativos, quer se trate de condomínios ou associações de moradores ou proprietários, respectivamente.
A principal diferença existente na forma de constituição está no tipo de propriedade que os adquirentes se sujeitam: se há todo ou parte do imóvel em regime de co-propriedade, estaremos diante de um condomínio; ao contrário, se cada um possui um lote individualizado sem qualquer co-participação em parte comum, provavelmente se estará diante de um loteamento, que pode ser fechado (murado), ou aberto.
Como exemplo de condomínios, podemos citar um edifício vertical de apartamentos residenciais, um edifício vertical de salas comerciais, e, até mesmo, um conjunto de casas ou lotes comerciais, padronizadas ou não, em que há ao menos uma área comum a todos os moradores.
Como exemplo de loteamentos, necessariamente citamos aquele conjunto de casas ou lotes, fechados por muro de limites de divisa ou não, em que cada dono de casa ou lote possui registro de propriedade única, servido por benfeitorias públicas, e sem nenhuma área comum de uso exclusivo de moradores.
Os condomínios são disciplinados no Direito Brasileiro pela lei federal nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964, e mais recentemente pelos artigos 1.331 e seguintes do Código Civil de 2002, e, logo no artigo 1º da antiga norma federal, encontramos definição legal que se encaixa ao acima dito: “As edificações ou conjuntos de edificações, de um ou mais pavimentos, construídos sob a forma de unidades isoladas entre si, destinadas a fins residenciais ou não-residenciais, poderão ser alienados, no todo ou em parte, objetivamente considerados, e constituirá, cada unidade, propriedade autônoma sujeita às limitações desta Lei”.
E o § 2º do artigo indica que “A cada unidade caberá, como parte inseparável, uma fração ideal do terreno e coisas comuns, expressa sob forma decimal ou ordinária”.
Ou seja, em condomínio, o proprietário possui a sua unidade autônoma, que pode ser apartamento, sala comercial ou lote, mas também, uma chamada fração ideal do todo do terreno e da construção, que seriam as áreas comuns de uso.
Diversamente, nos loteamentos, regidos na constituição física pela lei federal nº 6.766/79, e na jurídica, necessariamente, na forma de associações civis, nos termos do Código Civil, cada proprietário possui um título imobiliário individual, sem qualquer conexão com um todo, de terreno, ou de área de uso comum.
Nesses, que podem ser fechados com muros – os popularmente conhecidos por loteamentos fechados -, ou não, os loteamentos abertos ou bairros, as áreas coletivas são do Poder Público, como praças, ruas, quadras, etc.
Geralmente, a autorização para fechamento ou não do loteamento é regulamentada por lei do município em que se encontra a área do loteamento, e depende de critérios de aprovação disciplinados por cada local.
Em tal ponto, já identificamos uma situação que será importante no momento da definição da forma de custeio dos encargos de loteamentos ou de condomínios: os serviços postos à disposição dos proprietários serem prestados pela própria pessoa jurídica constituída (associação de moradores ou condomínio), ou pelo Poder Público.
Se os serviços internos (segurança, coleta de lixo, manutenção, etc.) forem prestados pela pessoa jurídica de direito privado, necessariamente as leis vigentes e os atos constitutivos do condomínio fixarão taxas condominiais obrigatórias a todos, e os atos associativos da associação de moradores poderão obrigar seus adquirentes a pagar encargos associativos mensais, por rateio.
Então, se a pessoa reside ou tem negócios num condomínio, residencial ou comercial, conforme o caso, as taxas condominiais mensais de rateio serão obrigatórias para custeio, conforme os termos do artigo 12, da lei nº 4.591/64, e do próprio Código Civil.
A inadimplência sujeitará o devedor aos encargos moratórios, e, ainda, poderá possibilitar a cobrança judicial, protesto (conforme o estado federativo do Brasil disciplinar), e outras penalidades administrativas que se prevejam nas convenções condominiais.
A grande questão que o Poder Judiciário tem enfrentado, e inclusive, alternado posicionamento de jurisprudência, reside nas associações de moradores de loteamentos.
Primeiramente, o assunto era tratado como se fora a associação de moradores uma pessoa jurídica de fato, ou um condomínio de fato. Aplicavam-se a elas as mesmas regras jurídicas do condomínio, inclusive, quanto ao caráter propter rem da dívida, ou seja, vinculariam e acompanhariam o imóvel, independentemente de eventuais transações imobiliárias sucessivas.
A análise do problema se modificou, principalmente após a vigência do Código Civil de 2002, embora ainda não sejam raras decisões no Tribunal de Justiça de São Paulo que assemelhem encargos associativos de associações de moradores às taxas de condomínios, até mesmo para se evitar enriquecimento sem causa de um morador, que use deliberadamente da segurança do loteamento fechado ou de outros serviços pagos coletivamente, mas não se associe para contribuir com o custeio disso e de outros benefícios.
O Superior Tribunal de Justiça começou a julgar a questão de forma diversa, ao se deparar com associações de moradores cobrando dívidas de moradores não associados, ou discordantes das benfeitorias decididas pela maioria.
Tantas decisões se avolumaram, que no Tema 882 dos recursos repetitivos, aquela Corte de Justiça, analisando matéria infraconstitucional, decidiu que não se pode obrigar alguém a associar-se (tácita ou expressamente) e diante da falta de previsão legislativa, a taxa associativa não pode ser imposta aos que não anuíram expressamente com a associação e com a cobrança.
Muitos moradores têm se utilizado de tal argumentação para tentar se livrar de cobranças judiciais que por vezes se arrastam por anos a fio, no mais das vezes com sucesso, ao menos mais recentemente.
O Supremo Tribunal Federal, no entanto, terá a chance de modificar o panorama. A matéria foi reconhecida de repercussão geral, no tema 492, pelo Ministro Dias Toffoli, e deverá ser votada nos próximos meses, onde se levará à matéria a análise sob a ótica constitucional.
É necessário atenção, de lado dos proprietários, e de lado dos diretores de associações e síndicos, pois uma análise equivocada da situação jurídica poderá levar a revés indesejado no futuro.
Bem assim, aos pretendentes adquirentes de imóvel, uma investigação simples em cartórios e fóruns, evitará dissabores possíveis com relação a dívidas preexistentes no imóvel.